domingo, 13 de novembro de 2011

Fantasma de Bruma


Fantasma de Bruma

O toque dos lençóis finos a incomodava e Alana sentiu-se impelida a deixar a cama. Os pálidos raios da aurora penetravam no quarto por entre as frestas da janela e o cheiro fresco do orvalho a atraiu para o extenso jardim da propriedade.
A grande mansão, repleta de salões imponentes, quartos luxuosos e moveis de preço exorbitante jamais a fizeram sentir a sensação que o grande jardim recordado ao meio por um riacho e rodeado por um bosque lhe dava. A doce mistura de paz e felicidade à preenchiam completamente. Quando Alana estava ali, cada som, cada cheiro e cada cor a encantavam de uma forma única e especial.
Ainda de pijamas e enrolada em um grosso casado para proteger-se do frio da manhã, Alana caminhou pelo gramado em meio à bruma, que rodopiava no ar, abstrata à paisagem, surgindo a partir do riacho e se espalhando pelo gramado.
A alta umidade a agradava e muito, já seus longos cabelos ruivos não gostavam tanto assim.
Alana subiu a passos lentos a ponte sobre o riacho que dava acesso ao outro lado do jardim e ali ela ficou, ouvindo o riacho invisível abaixo da bruma até que algo desviou sua atenção.
Uma silhueta alta, de proporções troncudas, provavelmente de um homem, traçava o gramado em direção ao bosque rápido e silenciosamente. Alana o observou atônita, paralisada de medo, e não sabia se o chamava  e descobria quem ele era ou se fugia de volta para a casa.
A raiva de ter um estranho andando na propriedade de sua família fez ferver-lhe o sangue e deu a Alana o ímpeto para chamar a atenção do estranho.
– Ei! Ei! Volte aqui! Quem é você? O que faz aqui? – Gritou ela de cima da ponte, rompendo o silêncio da manhã.
O homem cessou a caminhada e virou-se, olhando na direção da ponte e o espanto de Alana foi imediato a perceber que a imagem do homem deturpava-se na névoa.
Ele caminhou na direção da ponte de forma leve e rápida, quase como se não tocasse o chão. Também quase não se percebia a mudança na bruma densa que o cercava.
O coração de Alana agora ribombava no peito e somente naquele momento passou pela cabeça dela que o estranho pudesse lhe oferecer algum perigo.
O medo a fez estancar sobre a ponte enquanto o homem se aproximava cada vez mais. Observar a silhueta cada vez maior, a mais alta e de ombros mais largos a assustava. Ela gritaria? Ela correria? Não importava, ela só sabia que, caso precisasse, teria que fazer algo e fazê-lo rápido.
O estranho apresentou-se então a uma distância em que ela podia vê-lo e ouvi-lo e o  mesmo ponto de percepção se aplicava a ele.
Sem reação, Alana limitou-se a observá-lo. Era realmente alto e tinha ombros largos cobertos por um pesado casaco marrom. Sua pele era tão alva quanto a bruma que os cercava. Espessas mechas de cabelo negro lhe caiam sobre a testa e desciam por trás da cabeça até voltar a aparecer abaixo das orelhas, escorrendo pela nuca. O rosto estampava uma expressão nula, sem demonstrar nenhum sentimento ou intenção. O queixo quadrado, encimado por lábios finos pareciam translúcidos como fumaça enquanto somente os rasos olhos cinzentos estavam perfeitamente em foco.
O estranho olhava fixamente para os olhos verdes de Alana e ela começou a sentir um rubor subir pelo pescoço. Naquele ponto não sabia se era de raiva, ou talvez de vergonha.
– Desculpe minha intromissão na propriedade Srta. Valden, morei aqui a muitos anos atrás e não resisti a entrar novamente neste jardim, que está ainda mais bonito do que eu me lembrava – Disse o estranho, sua voz tinha um timbre profundo e penetrante, quase como se o som viesse do passado. – Me chamo Eric, Eric Cavalari.
– Como entrou aqui?
– Pelo portão do bosque, próximo à cascata do riacho – Respondeu Eric, também subindo na ponte.
– Nunca fui até aquele portão. – Respondeu Alana, sem desviar dos olhos dele, havia algo neles que ela não conseguia decifrar, era como se estivessem “fechados”.
– Deveria, é uma das grandes belezas da propriedade.
– A quanto tempo deixou a casa? – Alana sentia que a nevoa ao redor deles ficava cada vez mais densa, e o estranho homem estava cada vez mais próximo.
 – Já não me lembro mais.
– Pretende ficar? Falar com alguém?
– Não, na verdade, já estou indo.
Alana não entendeu como, nem por que. Talvez a proximidade, o tom baixo da voz de Eric, a fez deixar que ele se aproximasse, e por fim a beijasse. O beijo a preencheu como uma lufada de tudo que ela mais amava naquele jardim, como se todo o jardim pudesse ser resumido naquele beijo. Mas não durou muito, em um momento o beijo cessou. E ao abrir os olhos Alana estava sozinha, mas de alguma forma, ainda continuava sentindo a presença de Eric, rodopiando ao seu redor, como a bruma do riacho.  

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